Monday, January 22, 2007

As razões do meu SIM envergonhado! (continuação)

Escrevi-o antes e a campanha está a confirma-lo; confunde-se o eleitorado com o argumento de prender mulheres, por cobardia de discutir o essencial, a complexa questão que fomos chamados a resolver.
Não entro na questão metafísica do “momento da vida”; nem tenho conhecimentos nessa área, como não me parece que essa questão esteja em cima da mesa; em 84, aquando da aprovação da lei actual (igual à lei espanhola!!!), a questão terá sido encerrada: a legislação portuguesa, quando entram em conflito os direitos da mãe com os do feto, protege os primeiros em detrimento dos segundos! Se assim não fosse, seria crime a interrupção voluntária da gravidez em quaisquer circunstâncias!

Porque me assusta a legalização? Temo que num país sem educação sexual, sem verdadeiro planeamento familiar, sem estruturas e medidas de apoio à natalidade, muitas mulheres continuem a ser empurradas para uma gravidez indesejada e que a liberalização faça surgir a interrupção da gravidez como o caminho mais fácil.
Não conheço mulheres que depois de uma gravidez indesejada, tenho decidido ter o filho e anos depois se tenham arrependido; mas conheço o contrário!

O Estado não deve imiscuir-se na intimidade de cada um de nós, condicionando as nossas escolhas! Mas o Estado deve dar sinais, o Estado deve assumir prioridades: que escolha o Estado oferece quando liberaliza o IVG, sem que ofereça (de forma séria) uma outra opção?
Se entendo que a prostituta não deve ser presa, não defendo que se legalize a prostituição; se entendo que o toxicodependente é alguém que tem uma patologia e tem o direito a um tratamento médico, não sustento a legalização de todas as drogas, com distribuição de cocaína e heroína nos hospitais (e não queiram mentes mesquinhas sustentar, que estou a comparar a mulher que engravida a toxicodependentes ou prostitutas!).

Porque é hipócrita a pergunta? Porque vencendo o SIM, este SIM, vão continuar a existirem julgamentos contra mulheres, que continuam a ser qualificadas como criminosas, porque passaram dez semanas e um dia! Com este sim, a mulher que decide interromper a gravidez, o que nunca faz voluntariamente, mas por assustada entender que não tem outra opção, não precisa de consultar ninguém, de expor as suas razoes. Com esta liberalização, a jovem mulher que inadvertidamente engravidou, perde um forte argumento contra namorados, pais e maridos, para decidir levar a sua gravidez até ao fim. Com este sim, ou qualquer outro, vão continuar os abortos clandestinos, as clínicas milionárias, as nefastas consequências para a saúde desta mulheres.

Porque voto SIM?
Desde logo porque o crime de aborto é provavelmente o mais estúpido crime do Código Penal! É aviltante, abjecto, injustificado, não corresponde a nenhuma valoração moral ou social: não conheço ninguém que continue a defender de forma convicta que as mulheres que interrompam a gravidez devam ser presas!
Mas já assim era em 1998: e mesmo naquela campanha tendo ficado provado a existência de um enorme consenso nacional para a descriminalização, os partidos políticos nada fizeram, procurando retirar dividendos eleitorais em cima do sofrimento de milhares de mulheres.

Mas também voto SIM, porque apesar de uma sexualidade consciente, apesar da utilização de contraceptivos, uma gravidez indesejada pode acontecer; no caso de razões ponderosas o justificarem e por acordo entre os progenitores, interromper a gravidez poderá ser uma opção respeitável.

Voto SIM apesar de considerar que a lei que vamos aprovar é estúpida, incoerente, injustificada e hipócrita; faço-o porque ainda assim, uma lei nestes termos, é melhor do que não ter lei nenhuma!

2 comments:

xtk said...

concordo plenanemente com o exposto, e por esta ordem de pensamento não teremos sempre um preço a pagar pelos nossos actos? se não se liberaliza há injustiça nas penas efectuadas a estas mulheres, se por outro lado se liberaliza poderemos incorrer num mau uso da despenalização, e como dizes bem, num país onde o planeamento familiar é pobre, a educação sexual não existe (não me venham mentes hipócritas dizer que se faz)e por último nem a violação de direitos da mulher é correcta e eficazmente executada (como vemos nas páginas dos nossos jornais diários, a subjugação mantém-se). Por tudo isto bem pesado nos dois pratos da balança (e tb pk sou mãe, filha, irmã e amiga) não posso deixar de votar SIM. De qualquer das formas temos que ser cidadãos responsáveis e ao menos minimizar a hipócrisia e a utopia de um país que ser algo para o qual não tem habilitações básicas.
Ufff até me empolguei na escrita.
Boa semana e parabéns pela forma clara como exploras a tua perspectiva, bem dito (e escrito).

Tiago said...

O meu voto vai ser contra o sim...e o não votar sim é porque não concordo com a liberalização total tenho receio que caiamos no ridiculo de usar o aborto como método anticonceptivo que não é, como diz tenho receio que o aborto passe a ser uma solução fácil...também não concordo com a criminalização da mulher e só isso seria um motivo bastante forte para votar sim mas quando o sim significa liberalização total não tenho outra saída que votar contra o sim...acho que devia haver meio termo...uma avaliação caso a caso,acompanhamento das condições que levam uma mulher a fazer aborto, não uma liberalização total do aborto...também não concordo com a exclusão total do homem do poder de decisão..entre o sim liberalização total e o não criminalização da mulher para ser sincero não concordo com nenhum...tendo dúvidas e não concordando com nenhum dos lados por achar que são opiniões extremas provavelmente acabarei por votar em branco...tenho de medir bem...votaria sim sem dúvidas se tivesse só em questão a despenalização da mulher pois não concordo com a sua criminalização.